Módulo 1 – Comportamento reflexo e condicionamento clássico
Antes de iniciarmos o conteúdo específico deste módulo, será feita uma breve apresentação da ciência do comportamento e seus objetivos. Este conteúdo introdutório é necessário para que o aluno compreenda quais as razões e objetivos da ciência do comportamento. Quem foi Burrhus Frederic Skinner (1904 – 1990) ? Skinner foi um autor e psicólogo estadunidense que conduziu trabalhos pioneiros em psicologia experimental e foi o propositor do Behaviorismo Radical, abordagem filosófica que busca entender o comportamento inteiramente em função da história ambiental de reforçamento que por sua vez deu origem ao corpo teórico da Análise do Comportamento. Foi o propositor do condicionamento operante, uma evolução do condicionamento clássico. Lecionou na Universidade de Harvard onde também fez pós graduação. Escreveu uma série de livros que servem de referência para a psicologia comportamental. Sendo o mais famoso: Ciência e Comportamento Humano de 1953. Skinner A Ciência pode Ajudar? Skinner acredita que o poder do homem é maior do que sua sabedoria – por isso temos as guerras, armas, fome e pobreza. Acredita que a Ciência foi corresponsável pelas calamidades humanas, já que ela participa como tecnologia destes processos. A ciência não esta errada, mas sim a sua aplicação. Skinner propõe uma ciência para compreender o comportamento humano e colaborar para a melhora na qualidade de vida e na manutenção da sobrevivência, já que acredita que estamos num caminho da autodestruição. Os objetivos da ciência: A ciência não é mera descrição de fatos, é uma tentativa de se descobrir uma ordem e relação entre acontecimentos. A ciência prevê, trata o passado e o futuro. Tenta manipular o futuro. Se vamos usar métodos da ciência no campo humano, devemos supor que o comportamento, como os eventos da natureza, é ordenado e determinado. Essa possibilidade desagrada muitas pessoas por se opor a uma tradição longa que encara o homem como um agente livre, cujo comportamento é o produto, não de condições antecedentes específicas, mas de mudanças interiores espontâneas.
Questão Comentada: Ao questionar a possibilidade de liberdade humana Skinner propõe:
A) que não podemos fazer nada a não ser reagir aos estímulos ambientais
B) que a solução é uma sociedade na qual as pessoas não tem liberdades civis ou
religiosas
C) que a suposição do comportamento como algo determinado abre a possibilidade para
melhorias no panorama da humanidade
D) que a ciência irá solucionar todos os problemas desde que receba verba para fazer suas
pesquisas
E) que não existem diferenças entre o homens e os animais
Resposta: "C" . Skinner, parte do pressuposto que se o comportamento é um fenômeno determinado, isto abre a possibilidade de controle o que possibilita que mudanças concretas sejam realizadas. Mudanças que visam o bem estar da humanidade e do planeta e que sejam construídas através do método científico (e não político ou moral). As outras alternativas apresentam visões distorcidas da concepção de Skinner sobre a ciência, o comportamento ou a noção de liberdade.
O Reflexo Inato
Objetivos:
compreender o conceitos de reflexo como relação estímulo-resposta. compreender as propriedades do reflexo entender a relevância do reflexo no estudo das emoções Uma alteração no ambiente que produz uma alteração no organismo. Por exemplo: quando um alimento é levado à boca, o organismo produz salivação. Quando uma luz é direcionada para o olho, a pupila se contrai. Quando ocorre um forte barulho, você se assusta. Quando encosta a mão em um objeto muito quente o braço se contrai. Estes são exemplos de reflexos inatos, ou seja, é uma preparação mínima para sobrevivência e fazem parte do repertório comportamental dos organismos desde o nascimento.
A relação é representada desta forma:
Estímulo (S¹) elicia ( →) resposta (R¹)
Ex:
Luz elicia contração na pupila
Calor elicia sudorese
Fogo elicia contração muscular
Forte barulho elicia sobressalto
É importante observar que para a psicologia, reflexo significa sempre uma relação, entre um evento do ambiente (estímulo) e um evento do organismo (resposta), sendo que se diz que o estímulo elicia (provoca) a resposta. Na relação reflexa o estímulo sempre ocorre antes da resposta.
Como que se mensura o reflexo?
As medidas utilizadas são: intensidade do estímulo e magnitude da resposta
Para poder estudar a relação reflexa, é necessário quantificar tanto o estímulo como a
resposta e para isso utilizamos as medidas técnicas padrão, veja os exemplos:
Estímulos:
Som – medido em decibéis
Choque – medido em volts
Calor – medido em graus célsius
Alimento – medido em gramas
Respostas:
Salivar – gotas de saliva (mililitros)
Contração pupilar – diâmetro da pupila (milímetros)
Taquicardia – batimentos por minuto
Então já sabendo como se pode medir tanto o estímulo como a resposta, os primeiros cientistas comportamentais realizaram uma série de experimentos e descobriram algumas propriedades ou leis do reflexo que são universais para todos os organismos. Note que a descoberta destas propriedades faz parte dos objetivos da ciência, descobrir as características principais e padrões de ocorrência e relações constantes. Intensidade-magnitude: intensidade do estímulo é diretamente proporcional à magnitude da resposta. Esta propriedade ocorre da seguinte forma: quanto mais intenso (forte) é o estímulo, maior a magnitude (força) da resposta. Ou seja, se uma explosão muito forte ocorrer, o susto será proporcionalmente grande. Se uma luz fraca incidir sobre a pupila, ela irá se contrair muito pouco. Procure lembrar de coisas parecidas que já ocorreram com você e verifique como esta relação intensidade-magnitude ocorreu. Limiar: Limites mínimo-máximo para eliciar uma resposta. A propriedade de limiar descreve que existe um limite mínimo e um limite máximo para o qual o organismo responde, ou seja, se uma luz muito fraca incidir sobre a pupila, ela poderá não se contrair, ou seja, esta abaixo do limiar mínimo para que ocorra o reflexo. Se uma luz muito forte incidir sobre a pupila, ela vai se contrair ao máximo, mas depois se a luz aumentar, a pupila não vai contrair mais, pois foi atingido o limiar máximo do reflexo. Entenda como um intervalo entre o que o mínimo que organismo é capaz de sentir e o máximo que ele é capaz de responder. Estes valores mínimo e máximo podem variar sensivelmente de organismo para organismo. Latência: Intervalo temporal entre os eventos de estímulo e resposta. Quando você leva um choque, se passa um intervalo temporal entre o estímulo (choque) e a resposta (contração e taquicardia). Pode ser um intervalo muito curto, ou então um intervalo mais longo quando temos uma temperatura alta (estímulo) que elicia a resposta de sudorese. Esta propriedade estabelece que quanto maior a intensidade do estímulo menor a latência do reflexo (estímulo que elicia a resposta). Assim se estivermos em um ambiente com 30 graus célsius vamos demorar mais tempo para começar a suar do que se estivermos em um ambiente com 40 graus célsius. Note que além de suar antes, vamos suar mais (vide a propriedade Intensidade magnitude) se estivermos em um ambiente com 40 graus em relação a um ambiente com 30 graus. Além do tempo ser menor, a duração da resposta também varia de acordo com a intensidade do estímulo, ou seja, vamos suar antes e vamos suar por mais tempo neste ambiente de 40 graus. Habituação e Potenciação: Efeitos de eliciações sucessivas da resposta: Quando ocorrem eliciações sucessivas da resposta, é possível que o organismo fique habituado a elas. Em alguns casos podem ocorrer habituação (a magnitude da resposta diminui) e em outros pode ocorrer potenciação (a magnitude da resposta aumenta)
Na habituação:
As pessoas que vivem em grandes cidades ou próximas à aglomerações, deixam de “escutar” todo aquele ruído como se ele tivesse bem diminuído. Ou aqueles que vivem em ambientes muito frios, quando vem visitar o Brasil, mesmo no inverno falam que sentem calor. O organismo fica habituado a estimulação e deixa de reagir a ela com a mesma intensidade.
Na potenciação:
O efeito é inverso: o organismo fica mais sensível. Supondo que você esteja com enxaqueca, qualquer barulho parece insuportável. Isto é um efeito da potenciação de respostas.
Reflexos e estudo das emoções
Não sei se você está se perguntando: qual a relevância disso tudo para a psicologia? É preciso entender que se falando de ciência, precisamos sempre começar pelas coisas simples para depois ir para as mais complexas. E o reflexo inato é um dos tipos de
comportamentos mais simples que existem. Mas mesmo falando de algo simples podemos entender um comportamento que é foco da psicologia: as emoções humanas. Muitas de nossas emoções são respostas reflexas à estímulos ambientais: Medo, alegria, raiva, tristeza, excitação sexual etc. Se você for observar, quando sentimos emoções, estamos também respondendo de forma reflexa, ou seja, uma ação do ambiente elicia parte de nossas emoções. Na presença de um bandido (estímulo), sentimos medo (resposta). Na presença de um cão bravo latindo (estímulo), sentimos medo (resposta) A resposta de medo, na verdade é um conjunto de respostas fisiológicas: aumento da frequência de batimentos cardíacos, constrição capilar dos vasos sanguíneos e secreção de adrenalina.
O mesmo ocorre nas outras emoções e é lógico que esta não é a única forma nem conseguimos compreender tudo relacionado as emoções, mas já é um passo (científico) para compreensão deste tema tão importante para a psicologia. Respostas emocionais tem valor de sobrevivência para as espécies. Imagine se frente ao bandido ou ao cão raivoso, nós não fossemos capazes de reagir de maneira reflexa. Sem medo seria muito provável que levássemos uma mordida ou um tiro e assim a sobrevivência estaria ameaçada. Por isso os reflexos tem grande papel para a sobrevivências das espécies. E é importante notar que os reflexos inatos são universais para os organismos. Não é ainda algo relacionado a sua história de vida, mas a história de toda a nossa espécie. Se um animal não reagir frente a um predador, ele será facilmente comido e assim sua espécie como um todo fica ameaçada. Concluindo, boa parte do que entendemos como emoções são respostas fisiológicas
Exercício Comentado:
Considere a seguinte situação: Um predador se aproxima de sua presa e esta tenta fugir
rapidamente.
São exemplos de reflexos:
I - o aumento da frequência de batimento cardíaco da presa na presença do predador
II - a tentativa de fuga
III- a respiração da presa
São verdadeiras as seguintes afirmações:
A) I e II
B) II e III
C) I e III
D) I
E) II
Resposta: D. Predador elicia aumento da frequência de batimento cardíaco, isto é um reflexo (estímulo elicia resposta). As outras alternativas contém opções de resposta isolada ou de comportamentos que não são reflexos (fuga).
Resumo dos conceitos:
Estímulo: alterações do ambiente que produz mudança nos organismos
Reposta: alterações do organismos produzidas por mudanças do ambiente
Reflexo: relação entre estímulo e resposta (estímulo elicia resposta)
Intensidade do estímulo: força do estímulo
Magnitude da resposta: força da resposta
Saiba mais em:
MOREIRA, M. B; MEDEIROS, C. A. Princípios básicos de análise do comportamento. Porto
Alegre: Artmed, 2007. Cap. 1.
Objetivos:
O reflexo aprendido: Condicionamento Pavloviano
Compreender o condicionamento reflexo, a relevância do condicionamento reflexo para as emoções, as operações de generalização e extinção reflexa, Ivan Petrovich Pavlov e a descoberta do reflexo aprendido:
Pavlov era um fisiologista russo que estudava reflexos inatos e descobriu acidentalmente o
“condicionamento pavloviano”. Percebeu que antes mesmo de colocar a comida na boca de
um cachorro para medir a salivação, o cachorro já salivava (ao ver a comida). Passou então a estudar como os organismos aprendiam novos reflexos. A aprendizagem de novos reflexos também tem relação com a sobrevivência das espécies, pois apenas com o repertório dos reflexos inatos, isto pode não ser suficiente para um organismo sobreviver num mundo em constante mudança. O experimento clássico acontecia assim: Era feito um emparelhamento entre som de uma sineta e a apresentação de carne para o cão e a medição da quantidade de saliva produzida. Ele apresentava inicialmente apenas o som e o cão não salivava. Depois apresentava o som e logo após a comida e o cão salivava (pois a comida é um estímulo que elicia salivação). Após várias apresentações de som + comida, ele apresentava novamente apenas o som e o cão passava a salivar. Pavlov realizava as medições da quantidade de saliva (magnitude da resposta) e da intensidade dos estímulos (quantidade de comida e decibéis do som).
Vocabulário do condicionamento pavloviano:
Estimulo neutro (NS): É um estímulo que não elicia uma determinada resposta, é neutro
para aquela resposta. Ex: o som não elicia salivação mas pode eliciar um sobressalto caso
ele seja muito alto.
Emparelhamento: operação de apresentação de um estímulo seguido a outro estímulo
para produzir condicionamento.
Estimulo incondicionado (US), Resposta incondicionada (UR) : relação reflexa entre um
estímulo que elicia uma resposta como um reflexo inato (não aprendido). Ex: a comida
elicia salivação.
Reflexo condicionado, estímulo condicionado (CS), resposta condicionada (CR) : Relação
reflexa entre um estímulo que passa a eliciar uma resposta depois de um condicionamento
feito por emparelhamento. Diz que agora o som passa a eliciar salivação sendo ambos
estímulo e resposta condicionada.
Exercício Comentado:
Não é um exemplo de reflexo condicionado:
A) gostar de churrasco
B) desejar sexualmente uma pessoa do sexo oposto
C) desejar sexualmente uma pessoa do mesmo sexo
D) tremer no frio
E) gostar de sentir frio
Resposta: D. Tremer no frio e um reflexo inato, apesar disso é possível gostar de sentir frio que é um reflexo condicionado. Gostar de churrasco e atração sexual por pessoas são exemplos de reflexos condicionados pois foram aprendidos no decorrer da história de vida.
Condicionamento Pavloviano e o estudo das emoções
Já vimos que em grande parte as emoções também são relações entre estímulos e respostas. Os organismos aprendem a se “emocionar”. Difícil de controlar (são reflexas). Outros comportamentos que podemos compreender sob o paradigma do reflexo condicionado são as Fobias, “perversões”, modas, vínculos amorosos, “personalidade” etc. Um fetiche por saltos altos também é um emparelhamento entre o sapato (originalmente neutro) e o corpo feminino (que elicia excitação sexual). Generalização respondente: estímulos que tem semelhança física com o estímulo condicionado podem passar a eliciar a resposta condicionada. Se o cachorro aprendeu a salivar na presença de um som, um outro som com tonalidade parecida também irá eliciar a resposta de salivação. Da mesma forma se uma criança aprendeu a ter medo de dentista, ela poderá apresentar a mesma resposta reflexa quando estiver na presença de um médico ou de uma enfermeira. (roupa branca elicia resposta de medo) A magnitude da resposta depende do grau de semelhança entre os estímulos em questão. Assim é possível descobrir um gradiente de generalização, entre estímulos e respostas reflexas variando os estímulos. Uma pessoa que tem fobia de cachorros terá um gradiente de generalização no qual terá pouco medo frente a um cachorro de pelúcia, um medo de média magnitude frente a um cachorro pequeno e um medo de alta magnitude frente a um cachorro grande e latindo.
Respostas emocionais condicionadas comuns:
Muitas de nossas respostas emocionais não são inatas, a maior parte delas é aprendida. Mesmo que todos nós tenhamos os mesmos reflexos, isso se deve a uma história de aprendizagem comum. O medo de altura é um exemplo. Ele é aprendido e não inato. Como praticamente todos nós já passamos por eventos relacionados a quedas ou a
perigos envolvendo alturas, passamos a ter este reflexo condicionado. Extinção respondente e recuperação espontânea. Caso ocorra a apresentação sucessiva do estímulo condicionado sem o emparelhamento, o estímulo condicionado perde a função de eliciar a resposta. Caso o som seja apresentado ao cachorro por diversas vezes sem que sejam feitos outros emparelhamentos com comida, o som irá perder sua função de estímulo condicionado, voltando a ser um estímulo neutro para a resposta de salivar. Um fenômeno comum durante o processo de extinção é a recuperação espontânea, na qual a resposta que já estava extinta por um tempo, quando exposta novamente ao estímulo condicionado, retorna durante um período e depois se extingue completamente. É importante notar que a extinção ocorre apenas com a apenas com a exposição sistemática ao estímulo e não com a passagem do tempo, então se uma pessoa tem um “trauma”, esse “trauma” não irá passar com os anos, caso ela não seja exposta de maneira sistemática ao objeto que produz o medo. Contra condicionamento e dessensibilização sistemática. São duas operações que se utilizam do condicionamento clássico para tratamento de problemas psicológicos. No contra condicionamento um estímulo que elicia uma resposta contrária a que atualmente ocorre é emparelhado com o reflexo que se quer alterar. Ex: junto com o cigarro o indivíduo toma um xarope que elicia vômitos. Depois de se estabelecer o condicionamento o cigarro passa a eliciar vômitos também. Este tipo de procedimento é algo relativamente antiquado e não deve ser utilizado sem muito conhecimento técnico e experiência. Na dessensibilização sistemática, o organismo é exposto ao estímulo que elicia uma resposta de maneira frequente e gradual (usando um gradiente de estímulos) de forma que a extinção ocorra em todos os estímulos do gradiente. Um exemplo: para uma pessoa com medo de ir ao dentista, ela inicialmente é exposta a pessoas vestidas de branco em outros ambientes, depois exposta ao dentista em seu consultório sem sentar na cadeira e depois senta na cadeira mas sem nenhum procedimento odontológico e no final é realizado o procedimento odontológico. Só se passa para o próximo passo quando a resposta reflexa já foi extinta no passo anterior. Aplicações do Condicionamento Pavloviano: Terapia, Medicina, Propaganda, etc: É possível verificar que muito se pode fazer com o condicionamento pavloviano. A publicidade se utiliza muito deste procedimento, por exemplo emparelhando um objeto à venda com pessoas famosas ou situações agradáveis. É importante observar que embora isto seja utilizado, não necessariamente os psicólogos estão envolvidos com este tipo de prática, pois na psicologia temos um código de ética que não é compartilhado com outros profissionais.
Veja mais:
MOREIRA, M. B; MEDEIROS, C. A. Princípios básicos de análise do comportamento. Porto
Alegre: Artmed, 2007. Cap. 1.
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